segunda-feira, 5 de outubro de 2015

ARTHUR DE SALLES (1879-1952)

Arthlur Gonçalves de Salles nasceu e morreu em Salvador, capital da Bahia. Foi poeta, tradutor e escritor brasileiro. Em 1905 forma-se pela Escola Normal da Bahia. Em 1908 é nomeado bibliotecário da Escola Agrícola da Bahia, situada na vila de São Francisco do Conde. Publica seus poemas em diversas revistas da Bahia. Por essa época, participa dos serões, dos recitais de poesia na casa de seu tio Martinho Gonçalves de Salles Brasil, ao lado de seu pai, Severiano, da poetisa Amélia Rodrigues, dos Balthazar da Silveira, dos Mangabeira etc. A Revolução de 1930 fechou os Aprendizados e fez com que o poeta caísse em disponibilidade não-remunerada. Em 1935, é nomeado para o mesmo cargo de professor adjunto, para o Aprendizado de Quissamã, Sergipe. Enquanto estava em disponibilidade, foi ensinar no Instituto Baiano de Ensino de seus antigos condiscípulos Hugo e Giraldo Balthazar da Silveira. Leccionou português, francês e história. Arthur de Salles foi Imortal da Academia Baiana de Letras, ocupando ali a Cadeira de número 3, que ocupou até sua morte, em 1952. Aposentado não se divorciou da vida literária de sua província. Participou ativamente do movimento Nova Cruzada, aproximou-se dos jovens promotores de Arco&Flexa, frequentava as reuniões da ALA (Ala das Letras e das Artes). Filiado à Associação Brasileira de Escritores, era presidente da seção da Bahia, quando, em 1948, se realizou em Salvador um congresso nacional promovido pela entidade. Foi um dos fundadores da Academia de Letras da Bahia.






PÚRPURAS


Na púrpura do Verso o ouro do Sonho ardente,
Fio a fio, teci. Era manhã! Radiava
Em pleno azulo meu belo sol adolescente.
E o meu Sonho, a essa luz, resplendia e cantava.

Como a enrediça, a vida, indomada e ascendente,
Por minha mocidade em mil voltas serpeava.
E tudo, no esplendor de um mundo renascente,
Sonoro, multicor, multímodo, vibrava.

Musa, que não gemeu flébil, magoada e langue:
Vivaz, tonto de luz, salta o primeiro verso,
Ao primeiro rebate estuoso do meu sangue.

Ó selvas tropicais! Ó sonoras luxúrias!
Mundo excelso do Sonho, esvoaçando, disperso,
No incontentado ardor dessas rimas purpúreas!


***


MORS AMOR


Nesses tremendos círculos da vida
Erras, clamando, aflita e delirante.
Ao céu levantas a alma soluçante,
De preces e de súplicas ungida.

Dentro do teu clamor exulcerante,
Sem rumo e só, de dores combalida,
Vagas por esses círculos, perdida,
E giras nesse sorvedouro estuante.

Buscaste o amor; e o mundo era um deserto!
Teu coração, de lágrimas coberto,
Em vão gritou por quem o acalentasse.

O amor nos ermos corações morrera
— Árvores augusta, em plena primavera,
Que um sol maldito e bárbaro queimasse!


***



Grega

Recordo as glórias imortais e as lendas
Da tua Pátria, ó bela peregrina...
Recordo Queronéia e Salamina,
Lanças, escudos e as guerreiras tendas.

Lembro Cassandra e as predições tremendas.
Passam, num sonho fúlgido, à retina,
Homero e as Musas, a legião divina,
Do Tempo, eternos, palmilhando as sendas.

Mas o sonho maior e mais radiante,
É essa visão remota e perturbante,
Esse plaino da Argólida deserta

De onde penso que vens, de mirto e louro
Coroado a fronte, e toda, toda do ouro
Do sepulcro dos Átridas coberta.






PÚRPURAS


Na púrpura do Verso o ouro do Sonho ardente,
Fio a fio, teci. Era manhã! Radiava
Em pleno azulo meu belo sol adolescente.
E o meu Sonho, a essa luz, resplendia e cantava.

Como a enrediça, a vida, indomada e ascendente,
Por minha mocidade em mil voltas serpeava.
E tudo, no esplendor de um mundo renascente,
Sonoro, multicor, multímodo, vibrava.

Musa, que não gemeu flébil, magoada e langue:
Vivaz, tonto de luz, salta o primeiro verso,
Ao primeiro rebate estuoso do meu sangue.

Ó selvas tropicais! Ó sonoras luxúrias!
Mundo excelso do Sonho, esvoaçando, disperso,
No incontentado ardor dessas rimas purpúreas!


***


MORS AMOR


Nesses tremendos círculos da vida
Erras, clamando, aflita e delirante.
Ao céu levantas a alma soluçante,
De preces e de súplicas ungida.

Dentro do teu clamor exulcerante,
Sem rumo e só, de dores combalida,
Vagas por esses círculos, perdida,
E giras nesse sorvedouro estuante.

Buscaste o amor; e o mundo era um deserto!
Teu coração, de lágrimas coberto,
Em vão gritou por quem o acalentasse.

O amor nos ermos corações morrera
— Árvores augusta, em plena primavera,
Que um sol maldito e bárbaro queimasse!


***



Grega

Recordo as glórias imortais e as lendas
Da tua Pátria, ó bela peregrina...
Recordo Queronéia e Salamina,
Lanças, escudos e as guerreiras tendas.

Lembro Cassandra e as predições tremendas.
Passam, num sonho fúlgido, à retina,
Homero e as Musas, a legião divina,
Do Tempo, eternos, palmilhando as sendas.

Mas o sonho maior e mais radiante,
É essa visão remota e perturbante,
Esse plaino da Argólida deserta

De onde penso que vens, de mirto e louro
Coroado a fronte, e toda, toda do ouro
Do sepulcro dos Átridas coberta.




sábado, 5 de setembro de 2015

PAULO EIRÓ (1836-1871)


Paulo Emilio de Sales Chagas Eiró nasceu na Vila de Santo Amaro, São Paulo, e em 1871 fez os estudos primários com o pai, que era professor; posteriormente estudou na Escola Normal, entre 1851 e 1855. Iniciou o curso de Direito em 1859, mas precisou abandoná-lo por motivo de doença. Em seguida fez estudos no Seminário Episcopal, não concluídos por falta de vocação. Em 1854 ocorreu a estreia de suas comédias Traficante de Escravos, Chegamos Tarde... e Terça-Feira de Entrudo, em teatro improvisado na escola da Rua Direita, onde seu pai lecionava. Substituiu o pai, como professor, no período de 1855 a 1864. Em 1859 participou no concurso promovido pelo Conservatório Dramático Paulistano com a peça abolicionista Sangue Limpo. Publicou, em 1861, o poema Madressilvas no Correio Mercantil. No mesmo ano, ocorreu a representação da peça Sangue Limpo, no Teatro São Paulo, por ocasião do 36 º aniversário de D. Pedro II. Ainda em 1861, publicou a novela Carolina e os poemas Amor, Violeta, Vox in Excelso e Nenia, no Correio Paulistano. Seus poemas, que filiam-se à segunda geração do Romantismo, foram reunidos em livro na obra póstuma Poesias, lançada em 1940. Sobre sua obra, afirmou José Paulo Paes: "da extensa produção poética de Paulo Eiró, que quase nada publicou em vida, só chegaram até nós 190 poemas (...). Neles, Paulo Eiró se revela epígono da segunda geração romântica; é facilmente rastreável a influência de Álvares de Azevedo no tom de desalento e pessimismo de numerosos poemas. Já não o é, porém, nos versos de inspiração religiosa, ou nos de tema histórico e político, cuja eloquência cantante, de raiz hugoana (...), antecipa o Condoreirismo."









Soneto II


Quando, c'os olhos míopes, eu sigo
Esta vida que sempre nos ilude,
Como a dama, ao passar um ataúde,
Tenho ataques de nervos, meu amigo.

Logo ao nascer, arrancam-nos o umbigo;
Depois, a vara inspira-nos virtude,
E, ao amor dedicando a juventude,
Pomos as nossas costas em perigo.

Casamos... que tolice! O ano inteiro
Em inútil suor banha-se a testa,
Que a mulher nos dá cabo do dinheiro.

A velhice mil mágoas nos empresta;
Só do tabaco nos agrada o cheiro;
Chega a morte de foice e... acaba a festa.


***


Beijo de Mãe


Quando meu peito continha
Um coração inocente,
No regaço providente
De minha mãe repousei:
Ela, então, mal respirando,
Beijou-me, e eu acordei...

Depois, no peito bateu-me
O coração, violento:
Comovida, sem alento,
Outra mulher me beijou:
Esse férvido contato
Que eternidade selou!

Agora, tenho saudades
De meu berço, entre mil ais;
Lembro os risos maternais
E aquele afago inocente,
Porque, em lábios de mulher,
Só beijo de mãe não mente.



***



O Sobrado


Do céu à luz decadente
Contemplai esse sobrado
Que na face do presente
Lança o escárnio do passado:
Seu vulto negro ali está,
Nas trevas nódoa mais densa
Como sacrílega ofensa
Em alma perdida já.

Ei-lo! É no térreo degredo
Moço poeta a cismar,
Imóvel, como o penedo
Que escuta as vozes do mar.
Ei-lo aí! Dilacerado
Livro que o aquilão abriu,
E os segredos do passado
Aos meus olhos descobriu.

Esse teto quantos sonhos
Não abrigou de ventura!
Ai! quantos votos risonhos
Hoje o vento inda murmura!
Tristeza aqui não sentis?
Nestas lôbregas paredes
Tocante história não ledes
De alguma época feliz?

Apagou-lhe os caracteres
O tempo no andar veloz,
Imagem desses prazeres
Que deixam remorso após.
Passaste, oh quadra de amores,
Como o fumo em espiral,
E, perdendo tuas flores,
Secaste, pobre rosal.

Como em uma alma abatida
Por paterna maldição,
No que foi templo de vida
Hoje impera a solidão.
Aqui, a lira inquieta
Furta-se aos cantos de amor,
Embarga a voz do poeta
Um acréscimo de dor.

O homem sonha monumentos
E só ruínas semeia,
Para pousada dos ventos;
Como os palácios de areia
Dos seus brincos infantis,
Mal divisa o que apetece,
Que tudo se desvanece...
Feliz quem amou! Feliz!


HERCULANO NETO (1977 - )

Herculano Neto nasceu em Santo Amaro da Purificação. É poeta, ficcionista. Publicou pela Fundação Casa de Jorge Amado (Prêmio Braskem Cultura e Arte) o livro de poesia Cinema (Casa de Palavras, 2009) e, pela editora Mondrongo, A casa da árvore (Mondrongo, 2014). Pela Coleção Cartas Bahianas lançou o volume de contos Salvador abaixo de Zero. (Edição P55, 2012). Também assume a função de letrista de música popular e possui canções gravadas por Raimundo Fagner, Alcione, Roberto Mendes, entre outros...          






DESENCONTROS


não tenho medo de ser simples
tenho medo de ser oco
de ser raso

não tenho medo do esquecimento
tenho medo da lembrança feita de mágoa
do rancor

não tenho medo da rotina
da crise de meia-idade
da constância dos funerais
das mesmas conversas
dos mesmos amigos

tenho medo do verão
tenho medo da saudade

tenho medo dos caminhos que não segui
das escolhas que não fiz
dos desencontros




***



DIREITO PRESCRITO


nasci
com defeito de fábrica
defeito na alma

minha mãe não notou
meu pai não notou
ninguém notou

só perceberam
quando achei de me remendar
me colar
me parafusar

aí já era tarde


***




Cinema novo


cresci numa cidade
onde não havia mais cinemas
planos sequências se repetiam nas ruas
nos becos
projetados nos muros

cardinales bonitas
se revezavam
no curta-metragem
da minha infância

cresci numa cidade
onde não havia quase nada

apenas história para lembrar





NESTOR DA COSTA OLIVEIRA (1913-1977)*

Nestor da Costa Oliveira, filho do casal Manoel Gonçalves de Oliveira, apelidado de “Seu Né”, e Dona Maria José da Costa Oliveira. Nasceu no Município de Santo Amaro, no dia 10 de junho de 1913, no povoado de São Bento de Inhatá, distrito da Lapa. Formou-se em contador pela Escola de Ciências Contábeis, localizada no Largo da Piedade, em Salvador. Iniciou sua vida profissional como escriturário, na firma Magalhães S/A, Lavoura e Industria Reunidas, empresa à qual pertencia a Usina São Bento. Nas cidades de Nilo Peçanha, Cairu e Camamu, exerceu as funções, ora de secretário, ora de tesoureiro, nas prefeituras. Entre 1942 e 1945, exerceu as funções de prefeito de Nilo Peçanha. Período da interventria de Pinto Aleixo. Ainda em Nilo Peçanha, no dia 30 de janeiro de 1941, casou-se com Dona Glória Hora Rocha, tendo com ela os seguintes filhos: Isis da Costa Oliveira, Dólia da Costa Oliveira, Antônio José da Costa Oliveira e Grácia da Costa Oliveira. Em 1948, chega ao nosso município, o de Santo Amaro, Nestor da Costa Oliveira a convite do Prefeito Osvaldo Dias Pereira que iniciava a sua administração. Em 01 de abril de 1949, afastou-se das atividades de caráter administrativo assumindo as funções de educador, nomeado que foi para a regência da disciplina de Português do Gynásio Santamarense. Foi fundador do Jornal O Archote, exercendo o jornalismo. Foi vereador da Câmera Municipal de Santo Amaro, mandato exercido de 07 de abril, de 1963, a de dezembro do mesmo ano decorrente das divergências com o Prefeito em exercício. Em 26 de abril de 1977, no Salão Nobre da Prefeitura Municipal de Santo Amaro, lançou, a sua única obra editada, cujo título é Espelho de Três Faces. Por concluir ficou, um romance, titulado de Os Descedores do Jequié. Nestor da Costa Oliveira morreu no amanhecer do dia 23 de junho de 1979, no Arraial da Pedra, no município de Santo Amaro.






OBSTINAÇÃO


Pelo prazer de voar tal qual uma asa,
Ou folha solta sobre errante veio,
Indiferente à dor, à mágoa alheio,
Feliz na bruma ou renteando a vasa...

Fiel ao sonho eterno que te abrasa,
Dentro da cerração, da noite em meio,
Voar sem rumo seja o teu anseio
Que tu, meu coração, és também, asa!

Asa solta de um pássaro sem ninho,
Desamando os limites, sem caminho,
Com a flama do ideal que agito em mim,

Na vertigem da glória desmedida
De voar, de voar, que é um voo a vida,
De morrer voando sem chegar ao fim!


***


DESTINO


Dorme a cigarra o derradeiro sono
A tarde, à fulva luz no chão molhado,
Como a corola que do galho eivado
Fosse rolando ao vai e vem do outono...

Quem viu no espaço um luminoso trono
Abrindo ao sonho o pensamento alado,
Fez jus demais para ser muito amado,
Não devera morrer nessa abandono...

Ela-corpo sutil do vidro e laca
Que os restos do verão -pequena e fraca
Num milagre o largo som recorta,

Findo o tormento da jornada encalma,
Vai derramar o som que lhe vai n'alma
Dentro da concha de uma folha morta...


***





CONTRASTE


Por mais que eu faça nesta vida para
Imitar a formiga, à faina presa,
Sinto frustrado o esforço – e é vício e tara
No lábio alheio, o meu culto à beleza...

Por mais que eu saiba que é virtude rara
O trabalho, me entrego à natureza
Que, nenhuma alegria se compara
A de enflorir as leivas da tristeza.

Não penso em mim; todo me esqueço e, enquanto
Cuida a irmã da colheita, do consumo,
Do fermento, do pão de cada dia.

Cismo e bendigo o par de asas sem rumo
Para quem basta o sol que acende o canto,
Que a treva de outras almas alumia.








*
Este post foi sugerido e elaborado por meu amigo e poeta Dado Ribeiro Pedreira, que reuniu o material raríssimo  deste ilustre santamarense como ele... Muito obrigado, poeta!

terça-feira, 25 de agosto de 2015

ADRIANE GARCIA (1973 - )

Adriane Garcia nasceu em Belo Horizonte, Minas Gerais. É historiadora, funcionária pública, arte-educadora e atriz. Escreve poesia, infantojuvenis, contos e textos teatrais. Em 2013, venceu o Prêmio Nacional de Literatura do Paraná com o livro de poemas Fábulas para adulto perder o sono. No ano seguinte, publicou outra coletânea O Nome do Mundo.











BOIADA


Milhares nos carros de boi
puxando do horário comercial pra casa
da casa pro horário comercial
dormem em pé, cansados,
ruminam a grama verde que adubam
e não comem

É gado de pouco sonho
De pouca ração
De muito corte.

***



VIDA


Carro à deriva:
A enchente carrega
com gente dentro.

***



SOLIDÃO




o homem
procura
o outro
homem
só.

WESLEY CORREIA (1980 - )

Wesley Correia nasceu em Cruz das Almas, no Recôncavo Baiano. Licenciou-se em Letras Vernáculas pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), e mestrado em Literatura e Diversidade Cultural pela mesma instituição e doutor em Estudos Étnicos e Africanos pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), professor do Instituto Federal de Ciência, Educação e Tecnologia da Bahia – IFBa e membro associado do CLEPUL – Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias, em Portugal. É professor de Literatura Brasileira da Universidade do Estado da Bahia e foi um dos poetas convidados a representar o Brasil no XI Festival Latino-americano de Poesia em Dezembro de 2007 (Colômbia). É autor do livro Pausa para um beijo e outros poemas (Editora Nova Civilização, 2006) e tem participado como poeta e ficcionista de revistas e coletâneas. Em 2013, publicou o livro Deus é Negro – Da partida, Da Chegada, Da Multiplicação.  










2ª porta

         para Luciana Castro






Judite me olhou
com olhos de frio e luz
e disse: - Já vou!

Eu permaneci ali,
por dois mil anos, ali,
virando a
                 memória do
                                    instante
                                                encantado
                                    que
                     não
cessa.









Ação de despejo






Chegaram o promotor,
                    o juiz,
                    o policial.

Só os cristais,
na prateleira empoeirada,
permanecem incólumes.












Do mistério
          
para Alessandro Correia





Durou minuto?
          Segundo?

         O tempo
                   da dor
            (eterna dor)
                       de existir?

Seu nome, sem que eu o dissesse,
      me consumia:

Paulo, Paulo,

           mistério errante

           das coisas sem tempo.

FRANCISCO OTAVIANO (1825-1884)

Francisco Otaviano de Almeida Rosa foi advogado, jornalista, político, diplomata e poeta, nascido na cidade do Rio de Janeiro, em 26 de junho de 1825, e faleceu na mesma cidade em 28 de junho de 1884. É o patrono da Cadeira no 13, por escolha do fundador Visconde de Taunay. Era filho do Dr. Otaviano Maria da Rosa, médico, e de Joana Maria da Rosa. Fez os primeiros estudos no colégio do professor Manuel Maria Cabral, e no decorrer da vida escolar dedicou-se principalmente às línguas, à história, à geografia e à filosofia. Matriculou-se na Faculdade de Direito de São Paulo, em 1841, na qual se bacharelou em 1845. Regressou ao Rio, onde principiou a vida profissional na advocacia e no jornalismo, nos jornais Sentinela da Monarquia, Gazeta Oficial do Império do Brasil (1846-48), da qual se tornou diretor em 1847, Jornal do Comercio (1851-54) e Correio Mercantil. Foi eleito secretário do Instituto da Ordem dos Advogados, cargo que exerceu por nove anos; deputado geral (1852) e senador (1867). Como jornalista, empenhou-se com entusiasmo nas campanhas do Partido Liberal e tomou parte preponderante na elaboração da Lei do Ventre Livre, em 1871. Já participara da elaboração do Tratado da Tríplice Aliança, em 1865, quando foi convidado por Olinda para ocupar a pasta dos Negócios Estrangeiros, mas não a aceitou, ficando em seu lugar Saraiva. Como jornalista, empenhou-se com entusiasmo nas campanhas do Partido Liberal e tomou parte preponderante na elaboração da Lei do Ventre Livre, em 1871. Poeta desde menino, não se dedicou suficientemente à literatura. Ele mesmo exprimiu com frequência a tristeza de haver sido arrebatado à poesia pela política, por ele chamada de "Messalina impura", num epíteto famoso. Apesar da carreira fácil, respeitável e brilhante, cultivou sempre a nostalgia das letras. Sua obra poética representa uma espécie de inspiração do homem médio, mas não banal, o que lhe dá, do ponto de vista psicológico, uma comunicabilidade aumentada pela transparência do verso, leve e corredio. Em torno do eixo central de sua personalidade literária se organizam as tendências comuns do tempo, num verso quase sempre harmonioso e bem cuidado. Nas suas traduções de Horácio, Catulo, Byron, Shakespeare, Shelley, Victor Hugo, Goethe, revela-se também poeta excelente. Ficou para sempre inscrito entre os nossos poetas da fase romântica, mesmo que não tenha exercido a literatura com paixão, e o patriota que foi dá-lhe lugar entre os grandes vultos brasileiros do século XIX. Entre suas principais obras literárias, encontram-se Cantos de Selma, poesias (1872); Traduções e poesias (1881); poesias esparsas na Revista da Academia Brasileira de Letras, nos 15 e 16; Poesias, contidas na Lira Popular publicada por Custódio Quaresma. Outras obras: Inteligência do Ato Adicional (1857); As Assembléias provinciais (1869); O Tratado da Tríplice Aliança (1870); Questão militar (discursos proferidos no Senado e na Câmara dos Deputados pelo Barão de Cotegipe, Saraiva, Francisco Otaviano, Afonso Celso e Silveira Martins); Cartas, coligidas por Wanderley Pinho (1977).










Soneto

Morrer, dormir, não mais: termina a vida
e com ela terminam nossas dores,
um punhado de terra, algumas flores,
e às vezes uma lágrima fingida!

Sim, minha morte não será sentida,
não deixo amigos e nem tive amores!
ou se os tive mostraram-se traidores,
algozes vis de uma alma consumida.

Tudo é pobre no mundo; que me importa
que ele amanhã se esb'roe e que desabe,
se a natureza para mim está morta!

É tempo já que o meu exílio acabe;
vem, pois, ó morte, ao nada me transporta
morrer, dormir, talvez sonhar, quem sabe?

***



RECORDAÇÕES


Oh! se te amei! Toda a manhã da vida
gastei-a em sonhos que de ti falavam!
Nas estrelas do céu via teu rosto,
ouvia-te nas brisas que passavam:
Oh! se te amei! Do fundo de minh’alma
imenso, eterno amor te consagrei...
era um viver em cisma de futuro!
Mulher! oh! se te amei!

Quando um sorriso os lábios te roçava,
meu Deus! que entusiasmo que sentia!
láurea coroa de virente rama
inglório bardo, a fronte me cingia;
à estrela alva, às nuvens do Ocidente,
em meiga voz teu nome confiei.
Estrela e nuvens bem no seio o guardam;
mulher! oh! se te amei!

Oh! se te amei! As lágrimas vertidas,
alta noite por ti; atroz tortura
do desespero d’alma, e além, no tempo,
uma vida sumir-se na loucura...
Nem aragem, nem sol, nem céu, nem flores,
nem a sombra das glórias que sonhei...
Tudo desfez-se em sonhos e quimeras...
Mulher! oh! se te amei! 

***



ILUSÕES DA VIDA


Quem passou pela vida em branca nuvem
e em plácido repouso adormeceu;
quem não sentiu o frio da desgraça,
quem passou pela vida e não sofreu,
foi espectro de homem - não foi homem,
só passou pela vida - não viveu.


sexta-feira, 3 de julho de 2015

LEONOR SCLIAR-CABRAL (1929 - )

Leonor Scliar-Cabral nasceu em PortoAlegre, capital do Rio Grande do Sul. É doutora em Lingüística pela Universidade de São Paulo. Estudou fonoaudiologia e lecionou diversos cursos pedagógicos. Em 1991 foi eleita, na Universidade de Toronto, presidenta da Sociedade Internacional de Psicolingüística Aplicada. Foi presidente da União Brasileira de Escritores de Santa Catarina. Participa da construção de um banco de dados sobre a língua portuguesa. Entre muitas de suas obras publicadas: Sonetos (Florianópolis: NoaNoa, 1987); Romances e Canções Sefarditas  (São Paulo: Massao Ohno, 1990);  Memórias de Sefaradoutro (Florianópolis: Athanor, 1994); De Senectute Erotica (São Paulo: Massao Ohno, 1998, edição bilíngüe com trad. francesa por Marie-Hélène Torres); Poesia Espanhola do Século de Ouro (Florianópolis: Letras Contemporâneas, 1998); “O outro, o mesmo” (trad. poética, In J.L. Borges, Obra Completa, São Paulo: Globo, 1999); Cruz e Sousa, o poeta do desterro (versão poética para o francês com Marie-Hélène Torres das legendas do filme de Sylvio Back, Rio de Janeiro: Sete Letras, 2000) e O sol caía no Guaíba, Porto alegre: Bestiário, 2006. Prepara a publicação em 5 línguas dos sonetos Sagração do alfabeto. 





ZÁYIN


Defrontam-se os guerreiros na batalha
entre a tese e a antítese, entre o bem
contra o mal, entre o apoio e o desdém,
paralelas opostas por navalhas

que desferem os golpes e retalham
as hostes inimigas e detêm-se
diante da diagonal enfim refém
das pontas sobrepostas que a entalham.

Durante sete luas pelo obscuro
mar, a quilha fenícia o reversível
traçado vacilante e inseguro

vai semeando com os dedos espalmados:
só o que a pupila vê, o inacessível
e sua infinita tela descartados.


***


 
CHET


Barreira, muro ou grade, dominó,
tu abafas a voz subentendida
da qual depende a concha escolhida
para ouvir. Amordaça-nos o agora,

prisioneiros que somos como Jó
dos espaços estreitos, da guarida
sem futuro, da ação sempre impedida
pelos braços atados. O algoz

é o relógio imutável do mutismo,
condenando-a à prisão de ser silente
ou de ser a vassala do grafismo

da letra precedente. Garroteados,
só o porvir liberta essa torrente
subterrânea e o fogo represados.


***


SHAVOUT EM GRANADA


Teus pés pequenos sobem alamedas
pelos jardins de Alhambra e suas roseiras
antes que a lua cheia.

Romãs maduras pendem do teu cesto
e dos vinhedos cachos de uvas frescas,
antes que a lua cheia.

Com a perfumada flor de laranjeira
ornarás de guirlandas as estrelas
antes que a lua cheia

e as campinhas soem suas bênçãos
e o Rabi Yosef já comece a ler
antes que a lua cheia.

Antes que tinta em sangue a lua cheia
estanque essa fonte para sempre
de uma inconclusa e eterna fortaleza.


ARAYLTON PÚBLIO (1965 - )



Araylton Públio é natural de Urandi, Bahia, mas há muito fincou suas raízes em Feira de Santana, onde se licenciou em Letras com Inglês e fez mestrado em Literatura e Diversidade Cultural, na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e atua como professor. Para falar a verdade, Araylton é um artista de múltiplas faces. Há muito vem atuando como dramaturgo, diretor teatral e ator. Seus palcos: Feira de Santana e São Paulo. Paralelamente, jamais deixou de fazer suas incursões no terreno da poesia. Publicando sempre em jornais e revistas, e em seus livros, cujos principais títulos são Trovadores (Edições MAC, 2007); Sinais de transe (Edições MAC, 2007) e Canção dos corações foragidos (Salvador: Secretaria de Cultura e Turismo do Estado da Bahia, Fundação Cultural do Estado da Bahia, EGB, 1998.). 





SE É QUINZE DE NOVEMBRO...


Se troveja Deus está zangado
Se cai um garfo é uma mulher chegando
Estou cá no meu quarto escrevendo poemas
Que são borboletas que rapto

Uma amarela e preta aparece-me desde a infância
Uma fada sorrateira que contemplo em paciência

Se estou triste é porque sou Cristo
Se penso muito e pouco faço, não existo
Sou a metáfora alojada em mim
De asas pretas e amarelas...
Revoando enlouquecida


***


 
AI CAI


Troveja sobre nós
O céu se movimenta
Em caravelas azuis

Um instante de luz quebra o espaço
A chuva a cair sobre nós
Cai, cai, o tempo
Estamos a sós

A carruagem do destino que nos carrega
Está sem cocheiro


***


 
A CHEIA


Posta no olho do céu de prata
Lua enche os olhos d'água
Fica cheia a madrugada
Com pingos de estrelas pelas portas

A sete mil distâncias de mim
Mar de prata estancado
A grande chuva já se foi
Firmamento do espelho invertido

Uma estrela te segue
Ouço a tua derrama por dentro
Posta no centro do mar sedentário
Em ti eu saio, e me encho


WALQUÍRIA RAIZER (1980 - )

Walquíria Raizer é acreana, graduou-se em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Acre e especializou-se em Jornalismo Político pelo Centro Educacional Uninorte. Devido ao  engajamento pessoal com as manifestações culturais, tem o histórico profissional voltado para a política cultural. Defende a poesia como matéria-prima de todas as artes. Publicou O segundo ponto das reticências, em 2007.












RETICÊNCIAS


vou escrever qualquer coisa
que não pareça
nada
( ! )
esse tudo
é mesmo
o que
(devasta)



***



KATAUÊ


O miolo dentro da casca
(pão)

O miolo dentro
( da casca)

A casca virando

O miolo
O miolo
Miolo

Poderia
Correr
Sem
Léguas
(cem)

Um colar de castanha elétrica
Uma flor amarela
Muru

(estou tão acremente despida hoje que o açai perdeu a cor)



***


ACELERAÇÃO



...é como se tudo tivesse
girando
Um giro calmo
(e calculado)

Um giro bom
(pro mundo)

Mas o mundo
(é grande)
E não precisa de mim
( e de ti)

Mas eu, querida
Eu preciso do mundo
E ele está aí
(flertando)