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Bárbara
Heliodora
Guilhermina da Silveira foi uma das poetisas brasileiras assim reconhecida.
Foram seus pais o Dr. José da Silveira e Sousa e D. Maria Josefa Bueno da
Cunha. Para alguns estudiosos, era descendente de uma das famílias paulistas
mais ilustres: a de Amador Bueno, o aclamado. Alvarenga Peixoto e Bárbara
Heliodora viveram juntos por algum tempo, e só se casaram, por portaria do
bispo de Mariana, de 22 de dezembro de 1781, quando Maria Ifigênia, filha do
casal, já contava três anos de idade. Desta união nasceram quatro filhos. Para
Aureliano Leite em "A Vida Heróica de Barbara Heliodora", "ela
foi a estrela do norte que soube guiar a vida do marido, foi ela que lhe
acalentou o seu sonho da inconfidência do Brasil ... quando ele, em certo
instante, quis fraquejar, foi Barbara que o fez reaprumar-se na aventura
patriótica. Disso e do mais que ela sofreu com alta dignidade, fez com que a
posteridade lhe desse o tratamento de Heroína da Inconfidência".A poetisa
viveu entre a vila de Campanha da Princesa e a de São Gonçalo de
Sapucaí. O capitão-de-mar e guerra Alberto C. Rocha, no artigo publicado (sob
as iniciais A.C.R.) em 11 de outubro de 1931, em A Opinião de S. Gonçalo do
Sapucaí, explica as razões da decretação da demência de Bárbara: com o propósito
de se livrar da ameaça de seqüestro e execução, ela "vendeu", por
escritura de 27 de julho de 1809, os bens que ainda lhe restavam ao seu filho
José Eleutério de Alvarenga. Ora, tal manobra, ao que parece, prejudicava a
Fazenda Real; para que fosse anulada a citada escritura, Heliodora foi
declarada demente.
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SONETO
Amada
filha, é já chegado o dia,
em
que a luz a razão, qual tocha acesa,
vem
conduzir a simples natureza:
- é hoje que o teu mundo principia.
A
mão, que te gerou, teus passos guia;
despreza
ofertas de uma vá beleza,
e sacrifica as honras e a riqueza
às
santas leis do Filho de Maria.
Estampa
na tua alma a Caridade,
que
amar a Deus, amar aos semelhantes,
são
eternos preceitos da Verdade.
Tudo
o mais são idéias delirantes;
procura
ser feliz na Eternidade,
que
o mundo são brevíssimos instantes.
***
CONSELHOS A SEUS FILHOS
Meninos,
eu vou dictar
As
regras do bem viver,
Não
basta somente ler,
É
preciso ponderar,
Que
a lição não faz saber,
Quem
faz sabios é o pensar.
Neste
tormentoso mar
D'ondas
de contradicções,
Ninguem
soletre feições,
Que
sempre se ha de enganar;
De
caras a corações
A
muitas legoas que andar.
Applicai
ao conversar
Todos
os cinco sentidos,
Que
as paredes têm ouvidos,
E
também podem fallar:
Ha
bixinhos escondidos,
Que
só vivem de escutar.
Quem
quer males evitar
Evite-lhe
a occasião,
Que
os males por si virão,
Sem
ninguem os procurar;
E
antes que ronque o trovão,
Manda
a prudencia ferrar.
Não
vos deixeis enganar
Por
amigos, nem amigas;
Rapazes
e raparigas
Não
sabem mais, que asnear;
As
conversas, e as intrigas
Servem
de precipitar.
Sempre
vos deveis guiar
Pelos
antigos conselhos,
Que
dizem, que ratos velhos
Não
ha modo de os caçar:
Não
batam ferros vermelhos,
Deixem
um pouco esfriar.
Se
é tempo de professar
De
taful o quarto voto,
Procurai
capote roto
Pé
de banco de um brilhar,
Que
seja sabio piloto
Nas
regras de calcular.
Se
vos mandarem chamar
Pâra
ver uma funcção,
Respondei
sempre que não,
Que
tendes em que cuidar:
Assim
se entende o rifão.
Quem
está bem, deixa-se estar.
Devei-vos
acautelar
Em
jogos de paro e tópo,
Promptos
em passar o copo
Nas
angolinas do azar:
Taes
as fábulas de Esopo,
Que
vós deveis estudar.
Quem
fala, escreve no ar,
Sem
pôr virgulas nem pontos,
E
póde quem conta os contos,
Mil
pontos accrescentar;
Fica
um rebanho de tontos
Sem
nenhum adivinhar.
Com
Deus e o rei não brincar,
É
servir e obedecer,
Amar
por muito temer
Mâs
temer por muito amar,
Santo
temor de offender
A
quem se deve adorar!
Até
aqui pode bastar,
Mais
havia que dizer;
Mâs
eu tenho que fazer,
Não
me posso demorar,
E
quem sabe discorrer
Póde
o resto adivinhar.
***
O SONHO
Oh
que sonho! Oh! que sonho eu tive n'esta,
Feliz,
ditosa e socegada sésta!
Eu
vi o Pão de Assucar levantar-se
E
no meio das ondas transformar-se
Na
figura de um indio o mais gentil,
Representando
só todo o Brazil.
Pendente
ao tiracol de branco arminho
Concavo
dente de animal marinho
As
preciosas armas lhe guardava;
Era
thesoiro e juntamente aljava.
De
pontas de diamante eram as setas,
As
hásteas d'oiro, mas as pennas pretas;
Que
o indio valeroso altivo e forte
Não
manda seta, em que não mande a morte,
Zona
de pennas de vistosas côres
Guarnecida
de barbaros lavores,
De
folhetas e perolas pendentes,
Finos
chrystaes, topazios transparentes,
Em
recamadas pelles de sahiras,
Rubins,
e diamantes e saphiras,
Em
campo de esmeralda escurecia
A
linda estrella, que nos traz o dia.
No
cocar... oh que assombro! oh que riqueza!
Vi
tudo quanto póde a natureza.
No
peito em grandes letras de diamante
O
nome da augustissima imperante.
De
inteiriço coral novo instrumento
As
mãos lhe occupa, em quanto ao doce accento
Das
saudosas palhetas, que afinava,
Pindaro
americano assim cantava.
Sou
vassallo e sou leal,
Como
tal,
Fiel
constante,
Sirvo
á glória da imperante,
Sirvo
á grandeza real.
Aos
elysios descerei
Fiel
sempre a Portugal,
Ao
famoso vice-rei,
Ao
illustre general,
Ás
bandeiras, que jurei,
Insultando
o fado e a sorte,
E
a fortuna desigual,
Qu'a
quem morrer sabe, a morte
Nem
é morte, nem é mal.