quinta-feira, 31 de maio de 2012

TEÓFILO DIAS (1854 – 1889)

Teófilo Odorico Dias de Mesquita foi um advogado, jornalista e poeta brasileiro, sobrinho de Gonçalves Dias e Patrono na Academia Brasileira de Letras. Filho do advogado Odorico Antônio de Mesquita, e da irmã do poeta Gonçalves Dias, D. Joana Angélica Dias de Mesquita. Sua formação inicial deu-se de 1861 a 74, em São Luís, capital do estado, no Instituto de Humanidades. Mudou-se então para o Rio de Janeiro, onfe morou, albergado no Convento de Santo Antônio, por cerca dois anos (1875-76), realizando os exames preparatórios para o curso de Direito, onde efetivamente ingressa, em 1877. Neste período na então capital do país relaciona-se com muitos intelectuais, como Alberto de Oliveira, Artur de Oliveira, Aluísio Azevedo, Benjamin Constant, José do Patrocínio e Machado de Assis. Cursando a Faculdade do Largo de São Francisco, em São Paulo, conclui a formação em 1881. Ao largo da advocacia, exerce o jornalismo, colaborando com os jornais Província de São Paulo e A República, e ainda na Revista Brasileira, de José Veríssimo. Em 1878 participa da chamada "Batalha do Parnaso", formada por escritores que, no Rio e em São Paulo, reagiam contra o romantismo, sob influência de Artur de Oliveira. Foi, também, professor de Gramática Filosófica e Francês, no Colégio Aquino. Casara-se, em 1880, com Gabriela Frederica Ribeiro de Andrada, da família de José Bonifácio, com quem teve dois filhos: Gabriela Margarida e Teófilo. Ingressa na política, pelo Partido Liberal, elegendo-se deputado provincial em 1885, em mandato que durou até o ano seguinte. Manuel Bandeira assinala: "A estética parnasiana cristalizou-se entre nós depois da publicação de 'Fanfarras', de Teófilo Dias, livro em que o movimento anti-romântico começa a se definir no espírito e na forma dos parnasianos franceses, já esboçados em alguns sonetos de Carvalho Júnior...” Entre suas obras estão: Flores e Amores, Caxias, 1874; Cantos Tropicais", São Paulo, 1878; Fanfarras, São Paulo, 1882; Lira dos Verdes Anos, São Paulo, 1878; A comédia dos deuses, São Paulo, 1888.






A ESTÁTUA

Fosse-me dado, em mármor de Carrara,
Num arranco de gênio e de ardimento,
Às linhas do teu corpo o movimento
Suprimindo, fixar-te a forma rara,

Cheio de força, vida e sentimento,
Surgira-me o ideal da pedra clara,
E em fundo, eterno arroubo, se prostrara,
Ante a estátua imortal, meu pensamento.

Do albor de brandas formas eu vestira
Teus contornos gentis; eu te cobrira
Com marmóreo cendal os moles flancos,

E a sôfrega avidez dos meus desejos
Em mudo turbilhão de imóveis beijos
As curvas te enrolara em flocos brancos.


***


A NUVEM

Sulcas o ar de um rastro perfumoso
que os nervos me alvoroça e tantaliza,
quando o teu corpo musical desliza
ao hino do teu passo harmonioso.

A pressão do teu lábio saboroso
verte-me na alma um vinho que eletriza,
que os músculos me embebe, e os nectariza,
e afrouxa-os, num delíquio langoroso.
.
E quando junto a mim passas, criança,
revolta a crespa, luxuosa trança,
na espádua arfando em túrbidos negrumes,
.
naufraga-me a razão em sombra densa,
como se houvera sobre mim suspensa
uma nuvem de cálidos perfumes!


***


ASCENSÃO

Trago ao peito uma flor de fogo estilhaçada.
Cerro os olhos num leito e abro os olhos num horto ...
Em pânico atirara a suprema cartada
e entre os mortos sou vivo e entre os vivos sou morto...

Réu, vítima e juiz na consciência culpada
ante impasses fatais, mendigando conforto,
náufrago desditoso em pávida jangada,
ora ali, ora além, ao léu, sem luz, sem porto!

Por onde agora vou, aceito o estudo insano,
no pó da Terra, o lar de Deus!... Na dor da espera,
a lei de Amor!... No umbral do Espaço, o fim do engano!...

E endereço ao futuro a esperança perdida,
no azul de novo céu, no albor de nova era,
de cruz em cruz, de sol em sol, de vida em vida!...

Um comentário:

  1. ‘A Estátua’, de Teófilo Dias


    “The classics can console. But not enough.”
    Derek Walcott, in ‘Sea Grapes’



    Sem volteios, no soneto em questão, parece que o autor quis ver o objeto de seus afetos sob forma de pedra lavrada a cinzel, em cujas linhas se lhe poderia conservar talvez a sensualidade delicada das curvas (o que supostamente lhe atenderia ao desejo do olhar inquieto, que sempre busca saciar-se do belo, atraindo-o assim, com magnetismo sutil, ao repouso contemplativo). Eis ali uma depurada idealização do ser amado, abstraído da inconveniência de emoções vulcânicas e desarmônicas, reduzido a uma trêmula projeção onírica que desce à realidade e se materializa, feito luva a calçar-lhe com justeza os dedos das carências mais íntimas; ali, no pensamento do poeta, uma imagem fixa que ostentaria olimpicamente os atrativos de um corpo imperecível, alheio à decadência, onde a dureza da pedra daria aos encantadores detalhes a ilusão de estabilidade em face das mutações do tempo.

    Idolatria —. O homem, seco de sentido e magro, em ossos, de plenitude, caminhando perdido sob o sol incendiado da angústia, no ardente deserto que avança de suas paixões, busca dessedentar-se num oásis que é miragem no azul do horizonte. Põe-se ele no centro do mundo e passa a criar para si os objetos de sua fantasia inane, atrás de uma impossível satisfação, como quem fica de pé na rua, ao meio-dia, à espera do abraço amistoso da própria sombra.

    Com medo de amar, ao homem em sua ilha de egoísmo forja-se uma beleza fria, que delicia os sentidos, e não fere. Puro prazer para o que se pensa bastar-se a si mesmo em seus brinquedos. E assim aos olhos do poeta, aberta no impávido mármore branco, a beleza medrosa, que não arrebata nem faz padecer.

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