terça-feira, 11 de junho de 2013

JACINTA PASSOS (1914-1973)

Jacinta Passos nasceu em Cruz das Almas, Bahia, em 1914, foi autora de quatro livros de poemas — Momentos de poesia (1941), Canção da partida (1945), Poemas políticos (1951) e A Coluna (1958) —, elogiados por críticos do porte de Antonio Candido, Mário de Andrade, Aníbal Machado e Roger Bastide, entre outros. Seu livro mais importante, Canção da partida, foi ilustrado pelo artista Lasar Segall. Jacinta tornou-se uma das mais ativas jornalistas da Bahia na década de 40, escrevendo sobre os assuntos que mais a interessavam, pelos quais lutava: política, transformações sociais e posição da mulher na sociedade. Colaborou também com jornais e revistas do Rio de Janeiro e de São Paulo. Militante do Partido Comunista Brasileiro de 1945 até a morte, em 1973, dedicou grande parte da vida ao trabalho penoso, clandestino e cotidiano de luta por um Brasil menos injusto. A partir de 1951, sofreu crises nervosas periódicas, com delírios persecutórios, tendo recebido o diagnóstico de esquizofrenia paranóide, doença considerada progressiva e incurável. Apesar de internada em diversos sanatórios, jamais deixou de escrever, tanto poesia quanto prosa. Sua obra poética, fundada nas tradições populares da Bahia, contém fortes componentes líricos e apelo ao público contemporâneo, mas permanece pouco conhecida, pois seus livros, publicados por editoras de pequeno porte, tiveram tiragens muito reduzidas, sendo que apenas um deles, Canção da partida, foi reeditado, isso em 1990.  Fonte: http://www.jacintapassos.com.br








Estrela do Oriente

                                        para Bem Ami





I

Levantai-vos, párias de todo o mundo!
Não vedes? Ela vem vindo, a Estrela do Oriente,
alta, bela, imponente, os pés plantados no chão,
traz o fogo no olhar e uma foice na mão.



II

Canta, Jacinta, teu hino,
louva a Estrela do Oriente,
Mariana, Guiomar,
venham, venham me ajudar.

Não sei a cor de seus cabelos,
não posso saber,
não as linhas do seu corpo,
não posso saber.

Não posso vê-la à distância
como vejo o meu vizinho,
serei o seu sexo ou seu dedo mindinho?

Mariana! Guiomar!
Só na voz da própria Estrela,
podemos cantar.



***



Diálogo na Sombra


— Que dissestes,  meu bem?
Esse gosto,
Donde será que ele vem?

Corpo mortal.
Águas marinhas.

Virá da morte ou do sal?
Esses dois que moram no fundo e no fim.

— De quem falas amor, do mar ou de mim?


***



Canção do amor livre


Se me quiseres amar
não despe somente a roupa.
Eu digo: também a crosta
feita de escamas de pedra
e limo dentro de ti,
pelo sangue recebida
tecida
de medo e ganância má.
Ar de pântano diário
nos pulmões.
Raiz de gestos legais
e limbo do homem só
numa ilha.

Eu digo: também a crosta
essa que a classe gerou
vil, tirânica, escamenta.

Se me quiseres amar.

Agora teu corpo é fruto.
Peixe e pássaro, cabelos
de fogo e cobre. Madeira
e água deslizante, fuga
ai rija
cintura de potro bravo.

Teu corpo.

Relâmpago, depois repouso
sem memória, noturno.





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