quarta-feira, 18 de abril de 2012

MÁRIO PEDERNEIRAS (1867-1915)

Sua formação literária teve forte influência dos poetas franceses da escola simbolista e também de grandes poetas de língua portuguesa da época como Cruz e Sousa, Antônio Nobre e Cesário Verde, seus poemas eram marcados pela simplicidade e pelos temas da vida diária. Estreou na imprensa por volta de 1878, quando tornou-se colaborador do jornal estudantil O Imparcial, do Grêmio Literário Artur de Oliveira, no Rio de Janeiro. Entre 1895 e 1908 foi fundador, com Gonzaga Duque e Lima Campos, diretor e redator das revistas Rio Revista, Galáxia, Mercúrio e revista Fon-Fon. Esta última foi responsável pela segunda fase do movimento simbolista. Mário Pederneiras começou a escrever poemas em 1900, quando publicou seu primeiro livro de poesias, Agonias. Foi ainda colaborador de A Gazeta de Notícias, Sans DessousO Tagarela e Novidades. Cursou o primeiro e o segundo ano da Faculdade de Direito de São Paulo, entre 1887 e 1888, mas não chegou a concluí-la. Na década de 1910, trabalhou na elaboração em prosa da revista teatral inédita Dona Bernarda e da comédia também inédita O Dr. Mendes Camacho. Conquistou o terceiro lugar no concurso para Príncipe dos Poetas Brasileiros, em 1913, no Rio de Janeiro. Mário Pederneira foi um simbolista que se tornou, com o tempo, o cantor das alegrias da vida doméstica e também das tristezas que a assaltam. Poeta do lar, da saudade das filhas mortas, da gratidão à esposa, das coisas humildes como as árvores da rua, a mangueira do quintal, o passeio público, etc. Em 1921, foi lançado seu livro póstumo Outono, com versos de 1914, ilustrado por Calixto e João Carlos.







MEU CASAL
                                              
Fica distante da cidade e em frente                                       
À remansosa paz de uma enseada
Esta dos meus romântica morada,
Que olha de cheio para o Sol nascente.

Árvores dão-lhe a sombra desejada
Pela calma feição da minha gente,
E ela toda se ajusta ao tom dolente
Das cantigas que o Mar lhe chora à entrada.

Lá dentro o teu olhar de calmos brilhos,
Todo o meu bem e todo o meu empenho,
E a sonora alegria de meus filhos.

Outros que tenham com mais luxo o lar,
Que a mim me basta, Flor, o que aqui tenho,
Árvores, filhos, teu amor e o mar.

***



MADRIGAL


Teu olhar é tão manso,
Tão de ardências febris desprevenido e leigo,
Tão suave, tão bom, tão cheio de descanso;
Tão sereno é teu beijo,
Tão leve, tão sutil o teu próprio desejo;
Tudo
Em ti é tão meigo.
Sentimentos e Carne, Olhar, Voz e Carinhos.
Que muita vez sentindo,
Junto de mim o teu aspecto lindo,
Que meu amor intenso,
Indômito, açulado, espera e espreita,
Penso
Que tu, Querida, tu, és toda feita
De arminhos
E veludo.

Quer num suave enleio
Sentimental,
De idílio e de bondade,
Onde somente se destaque e arda
De ser querida a íntima alegria;
Quer na intimidade
Dominadora e treda,
De um lascivo coleio,
Quase de invertebrada e quase de oriental,
És a mesma de sempre, aromada e macia,
Oh! meu anjo de guarda!
Oh! minha linda Salomé de seda!

Um lago,
Sem ritmos agitados,
De água de brilho de aço,
Clara, fresca, parada,
Sob a seda de um Céu, à noite, em pleno Outono;
Um recanto de terra estéril, isolada,
Cheia de sugestões, de sossego e de sono,
De distância e de espaço,
Não tem a penugem do afago
Deste afago normal dos teus olhos dourados.

Estas longas arcadas solitárias,
De antigas abadias
Largas, sonoras e sombrias
E legendárias,
Da simbolizarão do sossego e da paz,
Da vida que repousa,
A fugir do rumor que atormenta e que infesta
O caminho vulgar que a vida humana pousa,
Tem qualquer coisa
Da honesta mansidão da tuAlma de honesta.

Quando mais para a Terra teu amor dirijo
E o quero mais humano
E exijo
Que meu desejo dessedentes
Em carícias mais fortes e mais francas
E te imploro

O sabor aromal do teu beijo sonoro,
Não me ficam nos lábios
Acídulos ressábios
Da ânsia sensual de onde a Volúpia espouca...

Só me fica na boca
A macia impressão de que beijo asas brancas. 


***



DOR SUPREMA

Que esta Suprema Dor que minh'Alma envelhece,
Que tanto me acabrunha e tanto desalenta,
Que repele a Ilusão, como o Sonho afugenta,
Que não cede ao clamor, como não cede à prece;

Que esta Suprema Dor que me prende e acorrenta
À mágoa de esperar o que nunca aparece,
Que se entranha na Vida e se alarga e que cresce
E de encontro à Alegria em lágrimas rebenta,

Seja o meu calmo abrigo, o meu sereno asilo
Onde minh'Alma vá, toda branca e alquebrada,
Pedir o Pouso e a Paz para um viver tranqüilo.

E que exsurja da Treva em que agora ando imerso,
Para eterna viver aqui — marmorizada —
Na tristeza imortal da Lágrima e do Verso.





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