Glauco
Mattoso, pseudônimo de Pedro
José Ferreira da Silva, é um escritor brasileiro. Seu nome artístico
é um trocadilho com glaucomatoso, termo usado para os que sofrem de glaucoma,
doença que o fez perder progressivamente a visão, até a cegueira total
em 1995. É também uma alusão a Gregório de Matos, de quem se considera
herdeiro na sátira política e na crítica de costumes. Glauco cursou biblioteconomia na Escola de Sociologia e Política de
São Paulo e Letras Vernáculas na USP. Nos anos 70,
participou da resistência cultural à ditadura militar através do grupo dos "poetas marginais". Além
de editar o fanzine poético-panfletário Jornal Dobrabil (trocadilho com o Jornal do Brasil e o formato dobrável
dos folhetos satíricos), colaborou em diversos periódicos da imprensa
alternativa, tais como o tablóide gay Lampião e
o humorístico O Pasquin.
Na década de 80, publicou trabalhos em revistas como Chiclete com banana, Tralha, Mil Perigos, SomTrês, Top Rock, Status e Around,
ensaios e críticas literárias no Jornal da Tarde, além de diversos volumes de poesia e prosa. Em 1982, edita a Revista
Dedo Mingo, como um suplemento do Jornal
Dobrabil. Nos anos 90, perde por
completo a visão em decorrência do glaucoma de que sofria há anos. Deixa de
lado a criação gráfica história em quadrinhos e poesia concreta) e passa a dedicar-se a escrever letras de músicas e à
produção fonográfica. Com o professor da USP Jorge Schwartz, ganha o Prêmio Jabuti pela
tradução que ambos fazem da obra inaugural de Jorge Luis Borges, Fervor de Buenos
Aires. Nos anos mais recentes,
retorna à criação de poesia escrita e textos virtuais, produzindo textos e
poesias para a internet, colaborando em revistas eletrônicas e impressas, tais
como a Caros Amigos.
A obra de Glauco Mattoso caracteriza-se pela exploração de temas polêmicos,
tais como a violência e a discriminação. O autor tem a reputação de "poeta
maldito", uma espécie de "Boca do Inferno" moderno ou Bocage pornográfico
do século XX. É autor, entre tantos livros, de: Apocrypho Apocalypse (1975) - coletânea com outros poetas; Memórias de um Pueteiro (1982); O Glosador Motejoso (2003); Centopéia: Sonetos Nojentos & Quejandos (1999); Cavalo Dado: Sonetos cariados (2004)...
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#6 MANIFESTO COPROPHAGICO [1977/1999]
A merda
na latrina desse bar
da
esquina de officina cheiro tem.
De fina
serpentina tem, tambem,
si folga
com rotina combinar.
Cocô com
cocaina, em tal logar,
commum é
tanto quanto ter alguem
cagado as
hemorrhoidas. Alli vem
o povo do
Brasil todo cagar.
Cocô
kosmopolita, palindromico,
até
kaleidoscopico e mutante,
se caga
no latino reino momico.
Vagina
americana avessa, cante
meu verso
a merda metrica, com comico
cynismo,
e faça a antithese de Dante!
***
#9 CENSURADO [1999] (*)
Sabendo
que a censura não me trava,
pediram-me
um soneto sem calão
p'ra pôr
na anthologia de salão
que o tal
do [censurado] organizava.
Queriam
até tonica na oitava,
mas nada
de recurso ao palavrão.
Usei o
ingrediente mais à mão,
porem sem
[censurado] não passava.
Desisto.
Quanto mais remendos metto,
mais
ropto vae ficando o [censurado].
Poema não
é texto de pamphleto
p'ra ter
que se estampar todo truncado!
Pois esta
[censurado] de soneto
que va
p'ra [censurado] [censurado]!
***
#21 BIBLICO (I) [1999] (*)
No Livro
dos Juizes é contada
A
historia de Sansão, um cabelludo
Tão forte
que foi rei do valetudo,
E um
bello dia não valia nada.
Trahido
por Dalilah, sua amada,
Virou
escravo até do mais miudo;
Perdeu
cabello e olho, e sobretudo
O orgulho
de jamais levar pisada.
Tambem eu
sou careca, cego e servo
De todo
philisteu que me espezinha;
Mas desde
a meninice inda conservo (*)
O trauma
de ser judas da turminha.
Não fui
Sansão, e nem siquer preservo
A fé de
ter de volta o que não tinha.
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