terça-feira, 11 de junho de 2013

ADRIANA LISBOA (1970 - )

Adriana Lisboa nasceu no Rio de Janeiro e vive atualmente nos Estados Unidos. Entre seus principais livros estão os romances Azul-corvo e Sinfonia em branco. Recebeu, entre outros prêmios, o José Saramago e o Moinho Santista. Seus livros foram publicados em doze países. www.adrianalisboa.com. A foto é de Julie Harris.






Por um instante de penumbra


Há sol demais por aqui. As sombras
expatriam-se dentro das coisas, sem uma
chance. A luz é cáustica,
esta luz de inquérito sob a qual o preso
não tem outra alternativa.
Você optaria por um mundo em claro-escuro,
mas tudo se revela (pior: se demonstra,
como num laboratório, como no corpo
aberto de uma cobaia) com enorme zelo e
não admite perfis, murmúrios, vislumbres.
Essa luz medonha que se esfrega
na sua cara – o quanto você não daria
por um instante de penumbra.
Por um segundo de indecisão.


***




poesia


Pense nela
como o dedo cavando a fresta onde
há ainda uma pequena chance,
algo semelhante à colher numa cela
de presídio investindo contra
o chão de barro: um túnel,
a vaga ideia de liberdade.


***



Blue Sunday


Não me lembro se foi on a blue Sunday,
como cantava Jim Morrison em nossos ouvidos.
Nem sei quantos atalhos tomamos, depois –
o herói de Truffaut é hoje um cara sério,
e nós, que o conhecemos
da época dos nossos quatre cents coups,
das nossas tardes sem nenhuma urgência
debruçados sobre o Rio, em meio aos turistas,
envelhecemos também. Sei que não disparam
os alarmes por nós: não somos nem mesmo
vaga ameaça. Mas nesse oco mal vedado
que ficou, sigo mendicante,
e carrego meias-luas sob os olhos
enquanto aguardo os tempos mais brandos
anunciados na canção.






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