sábado, 18 de abril de 2015

WLADIMIR SALDANHA (1977 - )

Wladimir Saldanha nasceu em 1977, em Salvador. Estreou com As culpas do poema (Scortecci, 2012), livro distinguido com o X Prêmio Literá­rio Asabeça para a Região Nordeste, categoria poesia. Esse primeiro título seria incorporado ao volume Culpe o vento (7Letras, 2014). Lançou ainda Lume Cardume Chama (7Letras, 2014) − obra selecionada para publicação pela Fundação Cultural da Bahia. Teve poemas publicados nas revistas Ângulos e Iararana e no extinto Suplemento Cultural do jornal A Tarde. Participou das antologias portuguesas Poetas na surrealidade em Es­tremoz (2007) e DiVersos – Poesia e Tradução (2008). Recebeu menção honrosa do Prê­mio SESC de Literatura 2011-2012, categoria livro de contos. Possui formação jurídica, área em que trabalha, sendo também mestre e doutor em Letras pela UFBA. Seu terceiro livro de poemas, Cacau inventado, tem lançamento previsto para o primeiro semestre de 2015, pela Editora Mondrongo, de Ilhéus. Wladimir Saldanha também escreve crítica literária, tendo colaborado com os jornais Rascunho e A Tarde, e desenvolve projetos de tradução. Uma amostra do seu trabalho pode ser acessada no blog Quinze para as Doze: http://quinzedoze.blogspot.com.br/










ICTIOMANCIA


Não venham me dizer que o peixe que veio dentro
do outro
é “como se fosse” o que não pesquei.

Não venham me dizer que o peixe deglutido
pelo maior
e que se revelou em meio a vísceras, foi o meu.

Se voltei para casa, mãos abanando, voltei sem peixe.
Se voltei
com um olho torto para o do colega, do tio ou pai,

voltei sem peixe − sem peixe e vesgo. Não venham
na pedra da pia
me oferecer a cria escarlate, que não foi gerada

pelo ventre: nem digerida. Desse, que veio dentro
do outro
não quero o louro, ramo de louro, feito de coentro.


(De Lume Cardume Chama. Rio de Janeiro: 7Letras, 2014.)



***


SÓ HÁ VERÃO NA MINHA RÚSSIA


Se guardei a sombra de meu pai,
colei-a no passo de um qualquer,
a quem sigo, sim, por onde vai
calcando essa relíquia sem fé.

Mas a sombra de meu pai, puída,
de repente se descola desse alguém
e ei-la que se faz também
órfã de quem tem pai na vida.

E cato a sombra, para o oportuno
uso ao sol, que me encandeia,
com ser sozinho, no diuturno
suplício dessa vã careta-meia

que quer sorrir, mas se obumbra
no meio-dia que palmilho.
Catar do pai a sombra, o filho,
e entesourar sua penumbra

para grudá-la a um par qualquer
de sapatos, de tênis, de saltos
altos − pois pode ser mulher
o pai sem pé nos meus retratos

e cuja sombra dou à súcia
dos que passam, sem jamais pedir...
Só há verão na minha Rússia.
Inventa um vento, Wladimir!


(De Culpe o vento; Rio de Janeiro: 7Letras, 214.)



***



ADONIAS DE VOLTA – SONETO XII



Neste elevado, avisto os cacaueiros
subindo longe a Serra Temerosa,
e a ilha que é o charco, pelo avesso;
e a falta, na paisagem, de uma rosa

que há mais de mês me trouxe o que não quero,
embora eu antevisse o aguaceiro:
de chuva – o que precisa a Temerosa;
de choro – o que dissolve rosto e Rosa.

A ilha pelo avesso que era o charco
semelha agora já não ser a ilha,
pois se desdobra em água e terra; e barco

deixa de ser, ao longe, uma novilha.
Sem Rosa, o destemor parece parco:
desaba um cacaueiro pela trilha.


(Da série Adonias de volta, IN Cacau inventado. Ilhéus: Mondrongo, 2015.)



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