Transfusão
Olho-te
e olho-me... E, após, sobre nós ambos cismo...
Tua
alma, como pôde a minha alma prendê-la?
És
candura e inocência, e eu vou errando pela
noite
negra do mal, da imperfeição, do egoísmo...
És
pura e eu sou impuro. Entanto (o íntimo diz-mo)
nossa
mútua afeição nada pode contê-la...
–
Para o meu doido olhar és a atração da estrela.
–
Ao teu ingênuo olhar sou a atração do abismo...
E
havemos de fundir nossas almas, Querida.
E
iremos, até soar da vida o último dobre,
como
em dois corpos, vês? Uma alma bipartida...
Mas
traremos, também, ao fim dos nossos dias,
–
tu, um pouco do lodo imundo que me cobre,
–
eu, um pouco da luz excelsa que irradias...
***
PERFEIÇão
PERFEIÇão
Doida
escalada!... O olhar nevoento e baço
vou
subindo a montanha... E, dia a dia,
mais
incerto e mais trêmulo é meu passo,
mais
a dúvida enorme me angustia...
Cada
degrau vencido é uma agonia.
Sonho...
mas para a altura ainda ergo o braço.
Sofro!
– agudo punhal, lâmina fria,
com
que eu mesmo, sorrindo, me trespasso...
Ah!
Terei de rolar esse declive
que
vim galgando, quase morto, exausto,
vendo
perdido o meu esforço em vão?
Ou
chegarei, à força que em mim vive,
lá
no alto, mas erguendo em holocausto,
roto
e a sangrar, meu próprio coração?...
***
Carne
Carne
a Andrade
Muricy
Para
purificar-me eu me faço o verdugo
de
mim mesmo, e me obrigo ao cilício da dor.
Luta
improfícua! Em vão minhas forças conjugo:
sou
vencido na liça... O instinto é o vencedor...
Debalde
eu me revolto e os ímpetos subjugo,
à
explosão do desejo em vão tento me opor.
Alma!
Tu sofrerás do corpo o eterno jugo,
curva-te
para sempre ao domínio opressor!
Carne,
que me tornaste um rastejante verme!
Ah!
Pudera fazer-te impassível e inerme:
–
brasa que se apagou, sombra, extinto clarão...
Carne,
que matarás o sonho que me exalta!
Negra
barreira a erguer-se, intransponível,
alta
no caminho lustral da minha Redenção!...
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