quarta-feira, 23 de maio de 2012

ALCEU WAMOSY (1895 – 1923)


Nasceu em Uruguaiana (RS), em 14 de fevereiro de 1895; e faleceu em Livramento (RS), em 13 de setembro de 1923. Publicou seu primeiro livro de poesia, Flâmulas, em 1913. Na época já trabalhava como colaborador no jornal A Cidade, fundado por seu pai, em Alegrete (RS). A partir de 1917, tornou-se proprietário do jornal O Republicano, apoiando o Partido Republicano. Continuou colaborando para diversos periódicos, como os jornais A Notícia, A Federação, O Diário e a revista A Máscara. Alfares republicano, lutou na Revolução Federalista, combatendo em Santa Maria Chica, Pontes do Ibirapuitá e Ponche Verde, onde foi ferido — ferimento este que provocaria a sua morte. Publicou as obras poéticas Na Terra Virgem (1914) e Coroa de Sonho (1923). Postumamente foram publicados Poesias Completas (1925), pela editora Globa, e Poesia Completa (1994), em Porto Alegre, na “Coleção Memória”, da EDIPURCS. Poeta simbolista, Alceu Wamosy escreveu poemas cheios de desencanto, em uma produção que se destacou no sul do país e que é uma das obras mais significativas do Simbolismo brasileiro, sendo o seu soneto “Duas Almas” um dos mais belos produzido em língua portuguesa. 








DUAS ALMAS

a Coelho da Costa

Ó tu, que vens de longe, ó tu, que vens cansada,
entra, e, sob este teto encontrarás carinho:
Eu nunca fui amado, e vivo tão sozinho,
vives sozinha sempre, e nunca foste amada...

A neve anda a branquear, lividamente, a estrada,
e a minha alcova tem a tepidez de um ninho.
Entra, ao menos até que as curvas do caminho
se banhem no esplendor nascente da alvorada.

E amanhã, quando a luz do sol dourar, radiosa,
essa estrada sem fim, deserta, imensa e nua,
podes partir de novo, ó nômade formosa!

Já não serei tão só, nem irás tão sozinha:
Há de ficar comigo uma saudade tua...
Hás de levar contigo uma saudade minha...



***



IDEALIZANDO A MORTE

Morrer por uma tarde assim como esta tarde:
Fim de dia outonal, tristonho e doloroso,
quando o lago adormece, e o vento está repouso,
e a lâmpada do sol no altar do céu não arde.

Morrer ouvindo a voz da minha mãe e a tua,
rezando a mesma prece, ao pé do mesmo santo,
vós ambas tendo o olhar estrelado de pranto,
e no rosto, e nas mãos, palidezes de lua.

Morrer com a placidez de uma flor que se corte,
com a mansidão de um sol que desce no horizonte,
sentindo a unção do vosso beijo ungir-me a fronte,
— beijo de noiva e mãe, irmanados na morte.

E morrer... E levar com a vida que se trunca,
tudo que de doçura e amargor teve a vida:
— O sonho enfermo, a glória obscura, a fé perdida,
e o segredo de amor que eu não te disse nunca!


***



SONHO HUMILDE

Assim te quero amar; quero adorar-te assim,
sempre de joelhos, sempre, ó mármore sagrado;
e que teu corpo ideal não seja, para mim,
mais que um horto de sonho, ou que um jardim fechado.

Em todo amor defeso há um encanto sem fim,
que o faz extreme e leal, lúcido e iluminado:
A mulher que se adora é a Torre de Marfim,
mais alta do que o mal, para além do pecado.

O amor deve viver perpetuado no sonho!
Só desejar é bom: Possuir é renunciar
à ilusão, que nos torna o desejo risonho.

Ter só teu corpo é ter um tesouro maldito;
mas, possuir-te na alma e adorar-te no olhar,
é ter o céu inteiro, é ter todo o infinito!





4 comentários:

  1. Que alegria ter lido essa seleção de belos poemas do -poeta gaúcho !

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  2. Falando em poetas gaúchos, cadê as poesias do Eduardo Guimaraens? E do Emiliano Perneta??

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  3. O soneto Duas Almas que ao poeta consagrou, certamente que é muito bom. Mas Idealizando a Morte me causou arrepios, visto que Alceu Wamosy fora ferido em combate como republicano na Revolução Federalista, no Sul na condição de alfares, o que lhe causou a morte: "Morrer com a palidez de uma flor que se corte,/ com a mansidão dum sol que desce no horizonte,/ sentindo a unção do vosso beijo ungir-me a fronte,/ - beijo de noiva e mãe, irmanados na morte./ E morrer... E levar com a vida que se trunca,/ tudo que de doçura e amargor teve a vida:/ o sonho enfermo, a glória obscura, a fé perdida./ e o segredo de amor que eu não te disse nunca." Um açoite na dor estes seus versos.

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  4. "Duas Almas" é um dos neus sonetos prediletos da alentada lista de belas poesias que elaborei ao longo de 85 anos de vida.

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