sexta-feira, 31 de agosto de 2012

PEDRO DE CALAZANS (1837-1874)

Pedro Luziense de Bittencourt Calasans, foi um poeta, crítico e jornalista da segunda geração romântica, conhecida como Ultra-Romantismo ou do “Mal-do-século”. Filho do tenente-coronel João José de Bittencourt Calasans, que mais tarde viria a se tornar um dos precursores da agronomia do Sergipe, e de Luisa Carolina Amélia de Calasans, nasceu o poeta no famoso engenho Castelo, propriedade da família de seu pai, e iniciou os seus estudos no Liceu de São Cristóvão, completando-os no Recife. Aos 16 anos publica "Adeus!", seu primeiro livro de poesias, e começa a contribuir para alguns periódicos da região. Segundo Sílvio Romero, enorme foi o prestígio desfrutado por Calasans nas rodas literárias de Pernambuco. Páginas Soltas  é publicado quando, em 1855, ingressa na Faculdade de Direito do Recife, na qual veio a bacharelar-se a 16 de dezembro de 1859. De volta à terra natal, então com 22 anos, ocupa interinamente a promotoria da comarca de Estância, Estado de Sergipe, casa-se com rica herdeira, mas logo se separa. É eleito deputado geral para a legislatura de 1861-1864 quando, ao ser absorvido pelas lutas partidárias, deixa o convívio das musas para dedicar-se à advocacia e a imprensa na capital do Império, onde se fez conhecido como atuante jornalista. No mesmo ano parte para a Europa, onde percorre vários países e retoma a publicação de seus livros: Ofenísia, em Bruxelas, Uma Cena de Nossos Dias (drama em quatro atos) e Wiesbade, sua obra mais conhecida, ambas em Leipzig, Alemanha. De volta ao Brasil, em 1867, abandona a política e é nomeado juiz municipal de Caçapava, São Paulo, onde publica mais quatro livros escritos durante a sua excursão pelo velho continente: A Campa e a Rosa, tradução de Victor Hugo, A Morte de uma VirgemA Rosa e o Sol e Qual Delas?. Segue a magistratura e é eleito deputado provincial no Rio Grande do Sul, mas consegue remoção para a comarca de Jeremoabo, na Bahia; no ano seguinte, quando começa a sentir o organismo definhando em conseqüência do mal de que só muito mais tarde se apercebe e que iria vitimá-lo. Em busca de tratamento para a tuberculose, procura o clima de Ilhéus, também na Bahia, sem nada conseguir. Esteve, depois, nas cidades de Serro e Diamantina, Minas Gerais, em busca de repouso e paz sob o clima das montanhas, também em vão. Afinal, a conselho médico, parte para a Ilha da Madeira, aonde não chega a aportar e falece a bordo do navio, próximo a Lisboa, Portugal.








LÁGRIMAS E AMORES



         Quando no espaço bruxoleia a aurora,
         Mandando à terra divinais palores,
         O doce orvalho, que nos campos chora,
                   São lágrimas e amores.

         Nas frescas tardes, nas manhãs de maio,
         Que aqui renascem, que ali brotam flores,
         Quando chorarem, o seu pranto amai-o,
                   São lágrimas e amores.

         Amai-o; as flores também têm segredos,
         Sim, vivem, morrem, têm sorriso e dores;
         Vede esse pranto, decifrai enredos,
                   São lágrimas e amores.

         Quando, transpondo do horizonte a corda,
         O sol se despe dos gentis fulgores,
         Brancas estrelas de que o céu se borda,
                   São lágrimas e amores.

         Quando na campa, que o cipreste esguio
         Com a sombra cobre de enlutadas cores,
         Chorarem brisas, que acordou o estio,
                   São lágrimas e amores.

         Quando o arco-íris lá no céu se arqueia;
         Para, chovendo, refecer calores,
         Esses gotejos por que o sol anseia,
                   São lágrimas e amores.

         Quando, por noites de luar ameno,
         O céu se esmalta de cem mil primores,
         Esses rorejos do sutil sereno
                   São lágrimas e amores.

         Quando branquejam, de manhã, neblinas,
         Cobrindo os campos, o que são? – vapores,
         Que o pranto gera das canções divinas,
                   São lágrimas e amores.

         Cristáleas águas, que o Amazona atira
         Nas nossas terras a trajar verdores,
         E os sons cadentes, que eu na mata ouvira,
                   São lágrimas e amores.

         As níveas pérolas de nitente alvura,
         Que a fonte clara salpicou nas flores,
         Serão segredos de amorosa jura?
                   São lágrimas e amores.



***



PARA O ÁLBUM DE UMA SENHORA



         Fora inútil pedir mimos à dália,
         Perfumes ao jasmim, nos céus da Itália
         Da mais nítida estrela a luz buscar.
         Fora inútil trazer incenso arábio,
         Ou sorrir divinal de fresco lábio
         Das mimosas gentis, netas de Agar.

         Fora inútil na página, que escrevo,
         Veroneso traçar sutil relevo,
         Pintando imagens de celeste alvor.
         À Golconda pedir belo diamante,
         E um lindo verso, que escrevera o Dante,
         Fora inútil buscar e aqui depor.

         Fora inútil pedir às Sorrentinas
         Uma nota sequer das cavatinas,
         Que elas cantam de amor, meu Deus, tão bem!
         Que eu deponho-te aqui maior tesouro,
         Que as riquezas de ofir, que o próprio ouro,
         Que o rico solo do Brasil contém.

         E o tesouro, hás de ver, é um nome santo,
         Como dos olhos maternais um pranto,
         Nas horas de partir, valendo o adeus.
         Tão doce como as moles serenatas,
         Como o som murmurante das cascatas,
         Ou qual prece infantil, que sobe a Deus.

         E esse nome, hás de ver, mais puro e belo,
         Que do insonte cordeiro o branco velo,
         Dos sacrifícios, que na Bíblia eu li,
         É doce como o cântico de uma ave,
         Mais doce que do Himeto o mel suave
         Em taça de ouro da mais linda huri.

         E esse nome, hás de ver, tem mais poesia,
         Que os sons acordes, que David tangia,
         Quebrando as iras do feroz Saul.
         Mais belo do que o sol dourando os bosques,
         Do que a lua a bater sobre os quiosques
         Da soberba e gentil, mole Istambul.

         E esse nome apurado em mil aromas,
         Que recenderam das ambrósias comas
         Da virgem, que por mãe Cristo escolheu:
         Esse nome melhor que um beijo helênico,
         Mais mimoso e melhor que um riso edênico,
         Esse nome, Maria, é o nome teu!



***



ESCUTA

        

 Se para amar-te for mister martírios,
         Com que delírios saberei sofrer!
         Se de altas glórias for mister a palma,
         Talvez minha alma possa além colher.

         Quebrar cadeias, conquistar um nome,
         Que não consome o perpassar das eras;
         Arcar com a fúria de iracundos nortes,
         Sofrer mil mortes, sem morrer deveras;

         Nas próprias carnes apertar cilícios,
         Nos sacrifícios ter sereno o rosto;
         Pisar descalço sobre espinhos duros,
         Com pés seguros, com sinais de gosto;

         Longe da pátria, no país mais feio,
         De tédio em meio, para amar-te, irei
         Viver embora sob a zona ardente,
         E ali contente por te amar serei!...

         E a ser amado, se é mister o incenso,
         Que sobe denso dos salões aos tetos;
         Serei altivo, mas não vou de rastos,
         Com lábios castos mendigar agetos!

         E se me odeias, por não ir-me às salas
         Dizer-te as falas de mendaz paixão,
         E, aos olhos de outros, profanando extremos,
         Dizer-te: amemos, e apertar-te a mão;

         Me  odeia, e muito, que eu não sou da farsa,
         Que o mal disfarça, que desfruta e ri!
         Me odeia, e sempre, que eu não desço ao nível
         Do pó terrível, que se arraste aí!

         Dá-me o teu ódio, pois não quero – escuta –
         Beber cicuta, procurando mel,
         Dá-me o teu ódio, mas num grau subido,
         Embora ungido de amargoso fel!

         Dá-me o teu ódio por fatal sentença
         A indiferença me será pior.
         Que um sentimento por mim sintas n’alma,
         Dá-me essa palma de um sofrer melhor!




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