MARINA
Preso
à noite
nesse cais
Ouço
a nave
lenta a ondular
E
o contramestre nervoso
Pelo
tombadilho.
-
Certeza de volta ao lar -
Tudo
sereno
onda boa
De
tuas pernas batendo
as
canoas.
E
noite adentro
a canção da aragem
Garoa
que refresca o alento
Me
lembra teu corpo amado
Entrevisto
num momento
De
descuido do vento.
***
SARANDI
A três quadras
do mar, à noite,
Do chalé da
praia de Sarandi,
Uma criança
podia ouvir ao longe
O clangor
gutural do mar e sentir os grãos do sal
Fertilizando
tudo. Teu coração batia com ele
Num misto de
exaltação, medo e ansiedade....
Como se pudesse
ser ali despido de meu corpo,
Como se a
qualquer momento eu pudesse ser levado.
(Grato, aliás,
por teres me sugado e aterrorizado!)
Ou era como
amar, como encontrar de novo o interrompido?
E à noite, ao
colocar os pés no chão adorado,
Ao sentir o
cheio sujo das sarjetas, não conseguimos
Nos conter, e
fomos até a praia para molhar os pés,
E caminhamos
até a barra,
Vimos os
últimos botos rompendo a película
Das águas em
suave cadência. Era tudo como era.
Teria naquele
dia engolido o mar, o ruído, o cheiro – a ambrosia
Que se abre dos
aromas acres, dos pólipos morridos,
Como uma
auréola infinita.
Parece se abrir
na imaginação
Mais do que a
infância é longa.
Mas havíamos
mudado -
E, não sabia, o
vigor do vento,
E do Mar,
repercutindo os pulmões taurinos,
Era um
interlúdio que ele
Representou
magnificamente, antes de se virar
Sem dizer adeus.
***
As
casas são silêncios quando deixadas sós:
Arrabaldes
da lembrança que a memória incita
Ao
remoer-se em suas mil reprojeções.
Um
quarto se liga ao outro, uma sala, uma cozinha, um corredor,
Uma
troca de palavras nas escadas: as casas são silêncios
Quando
deixadas sós.
E
eu o invoco, o estranho quadrúpede,
Que
pálido desperta do seu sono, ergue as patas,
Marcha
ao lugar antigo:
No
pensamento sou eu que agora contenho
Quem
outrora me continha.
No
pensamento
Onde
outra arquitetura a projeta, talvez com as frutas do quintal
Numa
eterna circulação de nascimento, corrupção e morte.
No
pensamento com a régua e algumas linhas fugidias,
Difícil
traçá-la ou evocá-la. Como habitar quem me habita.
Mas
ela está fria agora, sem o calor do fogo. A casa é uma extensão
Em
mim, que está perdido.
E
onde a voz que a preenchia?
Do
telhado que cobria os fundos se viam os primeiros raios.
Estrangulava-os
as mamonas que no azul,
Cresciam
mudas com seus grãos de espinhos, arregaçando
Estridentemente
os ombros verdes no baldio, sorvendo em desvario
Os
amarelos pulverizados. Eu as vi
Ao
me voltar ao leste aquele dia.
A
casa é uma extensão de mim que está perdida, ela é a sombra
De
todas as sombras ou talvez um labirinto dedálico do sonho
Que
retorna e sobressalta o insone: eu a busco
Na
parede mofada, no mijo do cachorro
No
vozerio-algazarra
Das
crianças que saiam da escola ao lado,
Na
textura suculenta das paredes, mas talvez
O
fio esteja perdido que a delicada aranha retramou. Imaginar aquele olho
Que
ouvia, via e escrutava pela casa.
O
simples esforço de recompor teu entorno, teu aspecto baldio, teus
Paralelepípedos,
tua flora de mau gosto me inebria e paralisa.
Agora,
num átimo, ele surgiu.
Entre
o imaginar e o que imagino
O
que me falta é eu.
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