quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

EMILIANO PERNETA (1866-1921)

David Emiliano Perneta nasceu e morreu em Curitiba. Formou-se advogado pela Universidade de São Paulo. Além de ter sido jornalista, advogado e professor de português, Perneta foi um dos fundadores do clube republicano de Curitiba e publicou, em livros, jornais e revistas, poesia e prosa poética simbolista. Sua obra poética inclui Ilusão (1911), Pena de Talião (1914) e os póstumos Setembro(1934) e Poesias Completas (1945). Incorporando ao sobrenome um apelido de seu pai, já nisso revela a excentricidade que o caracterizou, desde o traje até o ultraje ao Sistema: republicano no Império, abolicionista na escravocracia, simbolista como reação ao parnasianismo que o formara. Como demorou para reunir sua obra, passou despercebido da crítica, embora fosse influente entre os paranaenses. Metaforicamente esquisitos, seus sonetos são conservadores na forma e às vezes naquele medo da modernidade, típico dos simbolistas quando se refugiavam num passadismo, menos que decadentista, decadista, isto é, de décadas em vez de séculos.







VENCIDOS

Nós ficaremos, como os menestréis da rua,
Uns infames reais, mendigos por incúria,
Agoureiros da Treva, adivinhos da Lua,
Desferindo ao luar cantigas de penúria?

Nossa cantiga irá conduzir-nos à tua
Maldição, ó Roland?... E, mortos pela injúria,
Mortos, bem mortos, e, mudos, a fronte nua,
Dormiremos ouvindo uma estranha lamúria?

Seja. Os grandes um dia hão de cair de bruço...
Hão de os grandes rolar dos palácios infetos!
E glória à fome dos vermes concupiscentes!

Embora, nós também, nós, num rouco soluço,
Corda a corda, o violão dos nervos inquietos
Partamos! inquietando as estrelas dormentes!




***

AO CAIR DA TARDE

Agora nada mais. Tudo silêncio. Tudo,
Esses claros jardins com flores de giesta,
Esse parque real, esse palácio em festa,
Dormindo à sombra de um silêncio surdo e mudo...

Nem rosas, nem luar, nem damas... Não me iludo,
A mocidade aí vem, que ruge e que protesta,
Invasora brutal. E a nós que mais nos resta,
Senão ceder-lhe a espada e o manto de veludo?

Sim, que nos resta mais? Já não fulge e não arde
O sol! E no coril negro deste abandono,
Eu sinto o coração tremer como um covarde!

Para que mais viver, folhas tristes do outono?
Cerra-me os olhos, pois, Senhor. É muito tarde.
São horas de dormir o derradeiro sono.





***

DOR

Ao Andrade Muricy




Noite. O céu, como um peixe, o turbilhão desova
De estrelas e fulgir. Desponta a lua nova.

Um silêncio espectral, um silêncio profundo
Dentro de uma mortalha imensa envolve o mundo

Humilde, no meu canto, ao pé dessa janela,
Pensava, oh! Solidão, como tu eras bela,

Quando do seio nu, do aveludado seio
Da noite, que baixou, a Dor sombria veio.

Toda de preto. Traz uma mantilha rica;
E por onde ela passa, o ar se purifica.

De invisível caçoila o incenso trescala,
E o fumo sobe, ondeia, invade toda a sala.

Ao vê-la aparecer, tudo se transfigura,
Como que resplandece a própria noite escura.

É a claridade em flor da lua, quando nasce,
São horas de sofrer. Que a dor me despedace.

Que se feche em redor todo o vasto horizonte,
E eu ponha a mão no rosto, e curve triste a fonte.

Que ela me leve, sem que eu saiba onde me leva,
Que me cubra de horror, e me vista de treva. 



Um comentário:

  1. Ótimo post! Adoro a poesia dele, um dos maiores simbolistas do Brasil!
    Faltou a poeisa Azar, que acho muito boa!

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